segunda-feira, 9 de junho de 2025

O contador

 "Papai em 80 mudou-se da capital para cá, quando passou no concurso de procurador da câmara municipal. Ele e mamãe já estavam juntos há coisa de três anos. Protelaram a chegada de um rebento por mais de dez anos, até que vim ao mundo. Menino, com cinco anos, foi matriculado no colégio particular de maior renome da vila, o que significa estar reunido com cerca de mais vinte crianças, maioria composta por filhos de vereadores e comerciantes locais. A escola não difere muito da cara que tem uma escola estadual, até a pintura verde claro com branco e as carteiras fabricadas por detentos são as mesmas. A história das aventuras e rotinas que ali tive cabem em um escrito à parte. As primeiras brigas, a primeira namoradinha, as excursões para o zoológico e o parque aquático, coisas que crianças urbanas passam. Nada de anormal, mas, o que é mais interessante do que nossas vidas monótonas, desde que contadas de forma pitoresca, não é verdade?

Terminado o colégio, prestei o vestibular para entrar na USP e consegui uma proeza: ser aprovado para o curso de ciências contábeis. Hoje acresceram o vocábulo "atuariais" ao nome do curso. Não sou despachante, nem faço seguros. Mexo com folhas de pagamento e duplicatas. Ter passado quatro anos no ônibus entre o Butantã e Itapecerica me concedeu tempo demais para me enfadar da profissão antes de me consolidar nela. Trabalhar num escritório aqui é um tédio, assim como quase tudo por essas bandas. Novidade é o assunto no quilo do Centro, quando a Polícia resolve fazer uma limpa aqui, deixando cinco neguinhos mortos e mais uns três pendurados para o dia seguinte. Fora isso, novela e futebol."


Curtas

A política externa do Governo Lula III é inexistente. Não demonstra ser o reflexo de nada além de mero pragmatismo barbante, ou melhor traduzido seria: empurrar com a barriga o país mais ainda ao anti americanismo. O Brasil está fadado a permanecer como colônia de exploração, agora chinesa. A direita bolsonarista representa a reação: quer que o país permaneça como colônia americana. Eu, como sou arquitradicionalista quero retornar ao colonialismo europeu. 

***

O BRICS nada mais é do que a continuação dos chamados "Países não alinhados". Nada de novo debaixo do sol.

***

A máquina de propaganda do Kremlin continua trabalhando mundo a fora a todo o vapor, igual aos anos 1960. Se o comunismo morreu, a Rússia e o Comintern continuam agindo. O Imperialismo Russo é chaga que já tem alguns séculos, precede a URSS e a transcende. O seu fim só Deus sabe.

***

Lyndon LaRouche e Norberto Keppe entram em um bar...

***

E por falar no LaRouche, ele falava em uma conspiração entre Platão e Aristóteles, assumindo o lado do primeiro. Pergunto, quem manipulava a conspiração existencial antes dos dois filósofos gregos?



***

Desde que a Marina morreu eu fico extremamente comovido com a notícia ou a ideia do falecimento de qualquer animalzinho de estimação. O pensar na morte que acontecerá de qualquer um dos meus gatos já me arranca lágrimas. 

***




sábado, 3 de maio de 2025

A ladeira da minha memória

 Eu nunca conversei com um urbanista. Arquitetos sim, aqueles que ao que conste se dedicam ao planejamento de construções. Um urbanista que pense em problemas urbanos eu nunca conversei. Sei que existem. Até acompanho alguns por aí nas redes, mas nunca tive a chance de sentar com um desses raros profissionais para prosear. Será que eles são tarados por questões urbanas como eu ou como vários busólogos ou entusiastas de transporte costumam ser. 

Só sei que eu, desde os onze anos, sou um apaixonado pelo caótico da cidade. A coisa começou com um guia de ruas Mapograf de 1997, que guardo com carinho até hoje. Ali, época em que eu cursava a quinta série do ensino fundamental, eu comecei decorando nomes de bairros, ruas, ceps, distritos. No mesmo ano um rapaz da minha turma, chamado Tiago e sobre o qual eu não tenho mais nenhuma informação do seu paradeiro, que já era mais avançado, sabia de cor linhas de ônibus, itinerários e códigos delas. Esse menino tinha o pai marreteiro na feira. Era um menino bonzinho. Eu espero que Deus tenha tido misericórdia de sua vida. Ele na época já era office boy, isso com onze, doze, treze anos, que foi a última vez que eu tive notícia dele, pois passei a estudar em outra escola, um pouco afastada de casa, coisa de um quilômetro de lonjura. 

A primeira vez que andei de ônibus sozinho foi no ano 2000. Eu tinha 10 anos. Peguei um ônibus na Avenida Um, imagino ter feito uma baldeação no Rio Bonito e ter pego outro que passasse pela então nominada Avenida Robert Kennedy, hoje Avenida Atlântica. Havíamos mudado de bairro no segundo semestre daquele ano e meus pais estavam preocupados com a minha mudança de escola naquela altura do ano letivo. Se a memória não me trai, fiquei entre agosto e outubro fazendo esse trajeto, não sem muito custo para os meus país, custo em preocupação por pensar no gordinho andando sozinho de ônibus por ai. 

Recordo-me que em agosto de 2000 eu voltando para casa desci um ponto antes e decidi fazer um outro caminho para casa a pé. O suficiente para dar uns vinte minutos de atraso do horário de chegada habitual. Foi o suficiente para causar pânico na família. Meu irmão mais velho do meio e pai começaram e me procurar pelo bairro, foram nos comércios, avisaram a viatura da rádio patrulha. Daqui a pouco chego em casa, com a mochila nas costas. Acho que não apanhei, só levei um esporro qualquer. Mais tarde no mesmo dia já estavam me mandando na padaria ir comprar cigarro. 

Essa aventura de meia milha parece ter sido o fato derradeiro para que meus pais me mudassem imediatamente para uma nova escola, que fica em frente de casa até hoje. Nesse meu período da juventude comecei a andar mais de ônibus. Meu pai não dirigia mais desde fins do ano 2000, já que não tinha carro e enxergava com cerca de 20% da visão, apenas. O ônibus passou a ser indispensável. Era um período em que aqui onde moramos não havia nenhum grande mercado ou atacarejo próximo. Precisávamos nos deslocar de ônibus cerca de 4 quilômetros para a Cidade Dutra (onde havia um Sonda) ou para Santo Amaro, que contava com quatro supermercados na época (Sonda, do Shopping Center Sul - hoje Shopping Boa Vista, o Barateiro, o Futurama e o Sé). Meu pai ainda não totalmente combalido pelas enfermidades buscava trabalhos de pintor ou cuidador de imóveis (espécie de corretor que fica sentado em frente a grandes casas que estejam a venda em bairros finos, a espera de clientes que quisessem visitar a moradia). Nesse período andei bastante a cidade com ele: Pinheiros, Santo Amaro, Santa Cecília, Luz, Sé, Bela Vista, Paulista, Jabaquara, Vila Mariana. É onde me lembro de ter passado com mais atenção na época. As razões eram por trabalho dele, poucas, mas, sobretudo, para ir em médicos (o que aconteceu muitas vezes) e também por passeio ou para ir até a igreja. Foi um período de muito pobreza em casa. Embora não pagássemos aluguel, o dinheiro era pouco e contado. Meu pai era aposentado por invalidez, tinha pouca disposição de saúde para voltar a trabalhar e não tinha muitos ofícios disponíveis. Meu pai foi muita coisa, da miséria à riqueza foi bedel, guarda civil, motorista, vendedor, concessionário de veículos, dono de autopeças, político e por fim, aposentado. Não me consta que fosse vagabundo. Era nervoso, antigo, rústico, grosseiro. O seu casamento com a minha mãe me deixou um precioso ensinamento prático sobre a ideia de jugo desigual, onde ele era 18 anos mais velho, de origem geográfica distinta, cultura distinta da minha mãe. Um paulistano comum de pais interioranos e italianos e minha mãe nordestina. Choque de culturas que fizeram com que eu e meus irmãos presenciassem infindáveis discussões. Minha mãe parece ter sido muito triste e guardar muito arrependimento pelo que passou. Não sei se ela consegue compreender a coisa com o necessário fatalismo. Me parece que ainda tem a ideia de que tudo podia ter sido diferente. É uma inconformista. 

As minhas memórias são muitas e tenho pensado com mais frequência em deixar elas registradas. Evidentemente, para ninguém. Quem teria interesse nelas, quando eu estiver sem mente ou morto? Quem poderá se interessar pelas memórias de um sujeito ordinário como sou, que nada de espetacular fez na história? Talvez os historiadores da micro-história ou da história do imaginário ou das mentalidades. Quem sabe, por pouco tempo, algum ex-colega de faculdade ou do trabalho, ou ainda algum ex-aluno. Eu me interessaria por breves memórias biográficas de alguns deles. O homem é essencialmente um fofoqueiro. O historiador ainda mais. 

As memórias do ambiente, ou seja, da cidade são sempre muito vívidas, pois são objeto da minha preocupação desde essa época. A minha defesa da independência do estado de São Paulo é parcialmente filha dessa preocupação urbana, juntada com a formação de identidade regional. Eu sou eu em Santo Amaro, na Zona Sul e em São Paulo. O máximo da extensão geográfica da minha identidade é o estado. Além disso, não sou ligado à nada e pouco me importa um venezuelano ou um carioca, são iguais, ambos distantes da minha vista e do meu povo. Eu pego o carro e vou para Santos e vejo o paulista, que fala como eu. Vou para Campinas e ali quem vive é um paulista. Além das fronteiras do estado bandeirante nada me importa. São todos iguais ali. 

Terminei de ler essa semana um livro da coleção de livros, há muitos anos publicada pelo Arquivo Histórico de São Paulo. Trata-se do volume de 2019 que conta a história de um bairro que não transito habitualmente, a Vila Missionária. Bairro pobríssimo da zona sul paulistana, que no passado era famoso pela criminalidade e hoje, além da criminalidade é famoso também por ser o local de onde saiu a deputada federal Tábata do Amaral. 

A enormidade de São Paulo nos faz conhecer pouco a própria cidade. Eu devo ter passado de carro, mais tardar, meia dúzia de vezes pela Vila Missionária, indo para alguma igreja nas proximidades do bairro. Mas, quem conhece uma periferia de São Paulo pode dizer que conhece todas. Elas são todas idênticas. São compostas pelo mesmo substrato humano e social. São constituídas de ruas com má divisão no loteamento, com lotes pequenos, muitas vezes mal acabadas, por trechos que ainda intercalam vielas e escadões que levam para as favelas, que costumam, muitas vezes, ficarem nos fundos da área dos terrenos que foram minimamente loteadas (e que, comumente, dão para a avenida ou rua principal). Quem andou no Jardim Iporanga ou no Grajaú, ou ainda no Jardim São Luís já conhece a Vila Missionária, ainda que jamais soubesse da existência de lugar.

O livro escrito sobre tal bairro traz algumas informações bastante interessantes, ainda que o enfoque dado pelo autor, Aquiles Coelho Silva, seja o sociológico e não o memorial. A parte da memória, ainda que sempre presente, serve para levantar a bola para a análise da formação social e econômica da Vila Missionária. O nome do bairro, por exemplo, é em razão do loteamento ter sido feito por uma obra missionária da Igreja Católica, liderado por um padre chamado Aldo. O padre e sua obra missionária pretendiam criar um loteamento modelo, mas, pela forças das circunstâncias, aos poucos foram cedendo às necessidades da população pobre que foi se estabelecendo ali. 

Nas décadas de 1970 até 1990 se tratava de bairro em formação, com ruas de terra, barracos de madeira aos montes, ausência de luz nas ruas, sem coleta e tratamento de esgoto pela Sabesp, com poucas vagas em creches para que as mães pobres que tivessem que ir trabalhar em outros bairros tivessem onde deixar os seus rebentos. Essa realidade não é diferente de inúmeras periferias paulistanas e da grande São Paulo até os dias de hoje. Talvez alguns dessas defasagens públicas tenham sido minimizadas pela ação social do governo, mas, o grossos dos problemas permanecem. A atuação do poder público para os bairros pobres é sempre atrasadas e pouca. O pobre sempre está lascado várias vezes ao dia: trabalha em serviços ruins e de baixa remuneração, recebe pouco, corre mais risco de ser assaltado, se alimenta mal, cuida mal da saúde, é relaxado com a educação dos seus filhos. É um círculo vicioso. 

Eu defendo que a sociedade e o poder público não podem mais ignorar essa situação da pobreza urbana, achando que ela será resolvida com transferência de renda. A transferência de renda pura e simples é nociva. Se você for um revolucionário marxista irá achar que ela é um instrumento de cooptação das classes trabalhadoras ou do lumpemproletariado, que perderá assim a sua capacidade de ação revolucionária direta. Se for um liberal irá achar que essas pessoas tenderão a se acomodar e não buscar sair daquele estado de coisas que se encontram. Eu tendo a concordar com os dois lados da moeda. As políticas de transferência de renda precisam ser passageiras e totalmente atreladas com outras ações de maior porte do estado, como planejamento familiar, oferta de ensino adequado, garantia de segurança pública e transporte, reurbanização, oferta de cultura de qualidade que possa elevar e integrar essas comunidades pobres, tirando-as da cultura de gueto que muitas vezes estão enfurnadas. 

Minha visão de problemas urbanos como esse é muito distinta daquela que o autor do livro tem. Assim como ele eu também sempre fui pobre, mas meus pais tinham cultura e souberam me transmitir alguma dessa cultura. Ainda que as revistas que eu pudesse ler não fossem novas, a leitura sempre enriqueceu e trouxe parâmetros novos. A cultura musical rica dos meus pais não me levou para nenhum gueto. 

Já escrevi e defendo um amplo plano de reurbanização de favelas e política pública severa de combate às invasões. Vamos ajudar a essa população pobre a ter o ser apartamentozinho da Cohab. É bem mais digno. E quem tenham transporte público na porta, e escola de qualidade para si e para os seus. E quem possam ter emprego e se o governo tiver que transferir renda, que dê como complemento para quem tem já carteira assinada. Você trabalha e ganha um salário mínimo do seu patrão, é arrimo de família? Tome então mais 300 reais para complementar a renda. Dar dinheiro só por dar, para sustentar a vadiagem não é mais possível. Esta é uma grossa generalização, mas é assim porque há muitos casos.


quinta-feira, 1 de maio de 2025

Curtas

 Sejamos francos e realistas, a vida na grande metrópole não pode ser democrática, pois, considerando o império do número e do volume, não se pode esperar democracia real. Eleições não significam democracia. Na cidade de São Paulo com mais de dez milhões de moradores não pode haver democracia, pois por seu gigantismo e dinâmica da vida, não pode haver participação do indivíduo nas decisões do estado. A única coisa popular em grandes metrópoles e que realmente é fruto das decisões individuais é o comércio, o mercado. A única manifestação de democracia na metrópole está contida no desditoso livre mercado.

***

Populismo: o que começa em fúria termina em fadiga.

Não causaria nenhum espanto que após tanta grita e conflito entre o populismo bolsonarista e o populismo petista um novo governo aparecesse, com um sujeito anêmico, tísico, esquálido, cinza, sem sal e açúcar, que não entusiasmasse, antes passasse desapercebido da opinião pública. Um Eduardo Leite ou um Zema. 

Até que não é má ideia passar um lustro de tédio.

***
Leio notícia de que os antigos proprietários da Tok & Stok (não confunda com Tik Tok) compraram a Mobly, que, atualmente, era a controladora da própria Tok & Stok. 

O varejo passa por uma crise gigantesca. 

A margem de lucro dos supermercados, por exemplo, gira em torno de 1,5%, ao ano. Baixíssima. É ramo de risco, ainda que todos dependam dos mercados. 

No ramo de bazar a coisa vai pior ainda. Com a internet se mostrando mais e mais confiável como local para se fazer compras, magazines e lojas de departamento servem mais como mostruário ou como local onde se compra algo quando se está com muita pressa e não se pode esperar o que foi comprado pela internet ser entregue. 

Essa mudança na maneira de se comprar as coisas tem afetado a paisagem urbana. 

Regiões de comércio cada vez mais se veem dominadas por placas de aluga-se. Esse é o grande empreendedor da vez. Andando no Centro de São Paulo o que mais se vê são estabelecimentos comerciais fechados e para alugar. As regiões centrais precisarão ser reinventadas, sobretudo restaurando o império das moradias e o comércio de dia a dia: padarias, vendas, farmácias, quitandas, cabeleireiros, tinturarias, avícolas, etc.

Yakov Chernikhov. "Architectural Fictions," 1933.

***

Eu estou convencido que a população mundial do século XXI é obesa e tem outras tantas novas doenças por que estamos sendo envenenados com comida geneticamente modificada, planejada para criar doenças ou mutações genéticas que moldem um homem novo. Um velho italiano que morreu nos anos 1950 passou a vida comendo macarrão todo dia e nunca teve problema com glutem. Bebíamos leite gordo (A ou B) todo dia e não tínhamos intolerância à lactose. Não existia uma epidemia de autistas ou pessoas com Tdah. O que era borderline? 

E, digo mais, não me consta que essa galera que se acha fitness seja mais saudável do que os velhos e velhas do carteado na praça. Podem fazer muito exercício e acharem que comem saudável, mas, se enganam. Não confio nessas coisas que se dizem orgânicas. Pra mim é tudo enganação para uma seita de fanáticos veganos comunistas. Querem comer coisas naturais? Saiam das cidades grandes, voltem para o campo e plantem suas hortas e criem suas galinhas caipiras, com ovos de gemas super amarelas. Ai começamos a conversar.

***

Sempre desconfiei.

Em algum momento fui levemente simpático à Igreja Presbiteriana do Brasil.

Se fui, não sou mais.

Hoje tenho mais simpatia por todas as demais igrejas históricas: luteranos, anglicanos, morávios, metodistas, salvacionistas, batistas e tais.

Apesar de crer que ideia da soberania absoluta divina, nisso incluindo a questão da predestinação das almas eleitas para a salvação, tal como eles calvinistas presbiterianos dizem crer, vejo a Igreja Presbiteriana como uma denominação que não procura manter um diálogo aberto com as demais denominações. Como dão muita ênfase ao estudo teológico, numa época de grande vaidade intelectual onde não é cult ser pentecostal, acabam atraindo evangélicos de outros ramos pelos encantos e vaidades da retórica. Azar o daqueles que se deixam atrair por esse falso brilho (como aqueles que procuram o catolicismo pelo esplendor litúrgico ou arquitetônico, ou os que procuram as igrejas ortodoxas pelo tom soturno de seus rituais). 

O calvinismo é sinônimo de presbiterianismo. Não sou calvinista. 

terça-feira, 22 de abril de 2025

Geração de frutas

 As mães nos ensinam desde que mal pronunciamos qualquer palavra o que elas consideram educado e o que não consideram. Não só do que podemos, grosso modo, chamar de educação, mas me refiro àquilo que melhor pode ser qualificado como etiqueta. Como ser cortês, como ser fino, como ter bons modos, como entrar e como sair e, um fator importante e negligenciado: como não arrumar confusão ou como se livrar delas.  Há aquelas que dizem aos filhos: se fulano mexer com você na rua ou na escola, revide, meta a porrada nele. E há aquelas que falam aos seus rebentos: não arrume confusão na rua, fuja, minta, diz que não foi com você, que você não tem nada a ver com aquilo, etc. Em suma, a minha geração cada vez mais é cheia de dedos, ou seja, cheia de bons modismos. É acostumada somente em fugir dos problemas e não em enfrentá-los. Eu mesmo sou expert em fugir de todos os meus problemas e não enfrentá-los face a face. Aliás, eu diria, eu tenho a minha personalidade afirmada na ideia de que devo resolver os meus problemas não pensando nele, nem resolvendo, mas deixando o tempo e o afastamento resolverem os meus problemas. Se eu os esqueço ou se não os vejo, pronto, voilá, não há mais problemas. O homem quando não consegue fugir desses problemas ou esquece-los, por causa da força das circunstâncias específicas daquela situação, então se vê amarrado nas dores psicológicas, como a depressão, a ansiedade, os transtornos obsessivos compulsivos, síndromes e mesmo com problemas físicos ou psicossomáticos. 

Somos uma geração fraca, doente e covarde porque fomos criados como donzelos fracos, que só deviam fugir de seus problemas e não resolver as coisas na base da porrada e da força. Agora é tarde.

domingo, 13 de abril de 2025

A ação das sombras da inteligência na reorientação da federação.

A Abin, Agência Brasileira de Inteligência, órgão oficial civil de espionagem do estado brasileiro, publica a relação de seus agentes no Diário Oficial. Ao menos é a assim que a piada é contada. Caso seja verídico, creio que outros fatores mais específicos não estejam entre aqueles utilizados em um certame para a escolha desses agentes. Se eu sou presidente da república, e eu entendo que o presidente, apesar de todas as circunstâncias, quando tem moral, carrega em si uma autoridade quase imperial, consegue impor à administração pública a sua cara ou o seu perfil. Cito sempre um exemplo, a eleição de Jair Bolsonaro em 2018 foi tão avassaladora e colocou o estamento político em um estado de choque tão grande que, quase ninguém se tocou num detalhe, quando em 1° de janeiro de 2019 ele e seus ministros tomaram posse: aquela primeira versão do seu ministério havia sido o ministério menos nordestino da história recente. Apenas o ministro Canuto era oriundo daquela região. Mesmo sendo o Bolsonaro, que está longe de ter qualquer simpatia da imprensa, esse fato passou desapercebido e não foi questionado, apesar de ser razão para grita dos idenditarios e, é claro, das elites nordestinas. Isso não aconteceu porque a aura do poder imperial estava repousada sobre Bolsonaro naquele momento. Fosse no fim de seu governo, quando o encanto já tinha passado e ele estava nas cordas, pela ação do poder judiciário, teria sido mais um motivo para perseguição política e da mídia.

Dito tudo isso, cito outro dado. Historicamente, em razão do levante militar empreendido por São Paulo em 1932 contra o Brasil, as forças armadas brasileiras enxergam os paulistas com total desconfiança. Apesar da relevância populacional, geográfica e econômica, São Paulo não tem importância militar. As tropas instaladas aqui não tem relevância estratégica pensando em um conflito que parta daqui. A estrutura existente atualmente é pensada justamente para bloquear qualquer ânimo exaltado dos paulistas. É feita para sufocar qualquer rebelião ou insurreição paulista. Compreensível, de certa forma até, mas, é sintomático do que sempre foi a compreensão do Brasil, de colocar São Paulo contra a parede e deixa-lo amordaçado apenas pagando impostos. 

Sendo assim, considerando o que foi dito e o que já escrevi em outros textos nesse blog, onde defendo a criação de novos estados na federação brasileira, especialmente na região Sul, Sudeste e Centro-Oeste, como uma estratégia para reforçar a representação parlamentar dos estados produtores, que hoje estão em vergonhosa desvantagem perante os estados do norte e nordeste, penso que o chefe do poder executivo, desde que Paulista ou de outro estado dessas regiões, que tenha a compreensão plena desse problema e de qual pode ser a solução pacífica possível, deveria conduzir uma política de inteligência e segurança nacional para que as forças de inteligência oficiais do país, nisso incluindo a Abin e serviços reservados das Forças Armadas e Polícias estaduais para que estas sejam instrumentos para ajudar na formação das condições necessárias para que as regiões que devem se emancipar possam ter as condições sociais, culturais e psicológicas propícias para que a emancipação ocorra. 

Esse processo passa pela orientação certa na escolha do material humano que comporá esses corpos de inteligência do estado. O primeiro requisito é fazer avançar nos quadros de chefia pessoas oriundas desses estados. A outra orientação é a da doutrina. É necessário reorientar a doutrina de formação dessas instituições de inteligência para que compreendam a necessidade de uma reorientação geoespacial da federação brasileira. Por fim, tendo feito essa reorientação, tais agências começam a agir na criação de condições de fomento à ideia da emancipação dessas regiões. 

É claro que não é só esse aspecto que deve ser tratado para que a criação desses novos estados possa ocorrer. Mas, essa ação das sombras é essencial. 

sábado, 12 de abril de 2025

A falência inglesa.

Aprendi lendo alguma coisa por aí com a turma do Lyndon LaRouche, que é defensora da chamada "Escola Americana de Economia", que o liberalismo de tipo inglês, elaboração do escocês Adam Smith, é um instrumento para a o avanço do processo de riqueza dos países industrializados sobre os não industrializados. Isso porque os primeiros têm mais condições de avançar na tecnologia e nos preços, já que dominam a cadeia produtiva, enquanto aos segundos cabe entrar com a compra dos industrializados e fornecer matéria prima. Com alguma sorte e extrema competência desenvolver algum ramo da indústria nativamente e nisso se especializar. 

Poderia dizer que há muita ironia na história. Se a Inglaterra foi o primeiro país a se industrializar em larga escala e ser a terra em que o ideário liberal smithniano foi aplicado como dogma, hoje vemos esse país não ter uma indústria automobilística nativa de porte, nem indústria nacional de caminhões ou ainda padece em produzir aço para a construção de um novo submarino para sua armada, restando recorrer aos suecos e franceses nesse campo. 

Afinal de contas, os ingleses caíram na ladainha de Smith? Especializaram sua economia e viram quais as suas vantagens competitivas? Não é isso, é que estamos mesmo assistindo a destruição final do centro daquele que foi o maior império em extensão territorial de toda a história. A Inglaterra como império desapareceu com a Segunda Guerra Mundial, embora essa saída do cenário geopolítico de primeira importância já estivesse prescrito com o fim da I Guerra Mundial, quando os americanos saíram como os fiadores da Pax Mundial de então. Depois disso, só ladeira abaixo. Pós Mag Tatcher o liberalismo afundou ainda mais o país, ao contrário do que a direita neo-con adora veicular. Ainda que tenha determinados pressupostos coerentes, esse liberalismo econômico adotado no fim dos anos 70 e que perdura até hoje, é pensado milimetricamente para ser um solvente dos estados nacionais soberanos. É a ação econômica neoliberal de uma banda e a ação do marxismo cultural de outra. É o binômio da destruição de uma nação. A Inglaterra, controlada por muçulmanos e indostânicos, um país de ateus que não fazem filhos, um país abertamente em desindustrialização e desagregação política, que vive apegado às ilusões nababescas de uma vetusta monarquia. A Inglaterra, que no jargão futebolístico moderno, pode ser chamada de "ex-império em atividade". Essa mesma Inglaterra não sairá facilmente do atoleiro liberal modernista em que se meteu, assim como quase toda a Europa. 

Adendo: defendo que o Brasil, ou ainda, a América do Sul "compre" a Inglaterra. Explico. Baseado no poderia econômico atual sul-americano, especialmente da América Portuguesa, natural é que se invista noutros países. Para nós seria ótimo comprar a expertise do que sobrou de decente na indústria inglesa, especialmente nas áreas de infraestrutura, farmácia, química, varejo e todo o mais que for lucrativo. Dirão que é maluquice, mas não é. A JBS-Friboi, AmBev e Kfraft-Heinz estão aí para reforçar a minha tese. 

segunda-feira, 31 de março de 2025

Uma historiografia das épocas

Cada período escreve a sua história dando ênfase na inquietação daquele momento. A observação é do professor Hilário Franco Júnior, no livro A Idade Média, nascimento do Ocidente. Ele aponta: a pólis grega marcou com o aparecimento da história política; a idade média em seus mosteiros preparou as biografias de santos, as hagiografias; a afirmação dos estados e monarquias nacionais no século XVIII trouxe a história dinástica e nacional (comento: e o século XIX, antevendo a crise dessas monarquias, com o romantismo, buscou reforçar essa identidade nacional); por fim, no século XX de esperanças utópicas (socialistas e liberais-democráticas) o estudo da história das mentalidades. 

E a história do tempo presente, da geração do novo milênio? Me parece ser a geração da história da loucura, da desorientação planejada e mesmo da história da indecência. 

A linha de pesquisa do historiador é uma afirmação do seu entendimento final de sua época sobre si mesma ou sobre outro período. Como vivemos tempos anarquicos e dementes, somente uma historiografia da indecência e da loucura poderia ter voz forte. 

sábado, 8 de março de 2025

O presidente eventual

"O "Diário" informa que o presidente eleito comprou um sobrado em frente da casa de sua família, onde morou nos últimos quarenta anos. A reportagem apurou que o presidente eleito tem a intenção de fixar morada eventual na nova casa, já que Brasília o mantém longe de sua rotina diária, que inclui a convivência com seis gatos e uma igreja, onde frequenta semanalmente. Para a capital federal ficarão reservados no máximo dois dias por semana. A vontade do presidente eleito é que seu mandato fique marcado como o mandato em que o presidente mais tempo passou longe do palácio.".

Uma morada de infância

 Esses dias resolvi com a minha mãe, aproveitando a calmaria do feriado de carnaval, ir passar em frente de duas casas onde moramos nos anos 1990. Uma delas, pelo que pude ver pelo satélite do Google Maps ainda está lá. Como ficava nos fundos de uma casa principal, ela não pode ser vista da rua. Quando lá morei, a casa principal era sede de uma firma de BATATAS FRITAS. Sim, uma empresa que cortava, fritava e embalava batata frita, dessas tipo Lays ou, mais bem comparando, aquelas batatas que se vendem nos carrinhos de pipoqueiros. Cresci vendo durante vários anos o funcionar daquele pequeno engenho. 

Eu não me queixo disso da minha infância. Ao contrário, tive uma infância maravilhosa. No terreno ao lado de nossa casa, que foi desmembrado nos anos 2000 e uma enorme casa, um verdadeiro mausoléu de cinco quartos e vários banheiros foi erguido, naquela época abrigava várias árvores frutíferas como mangueiras e jabuticabeiras. Também criávamos galinhas e, se a minha mente não me engana completamente em um surto de megalomania, chegamos a ter até um leitãozinho. Era uma área enorme, uma chácara de perímetro urbano. Aliás, nos bairros mais afastados de São Paulo vi muitos terrenos enormes como esse, que eram do porte de chácaras. Hoje são raríssimos, considerando as invasões e a expansão imobiliária. 

Paramos em frente e ficamos olhando pela grade. Os dois lotes e suas construções não tem moradores, mas, não estão abandonadas. Nota-se que há ainda cuidado com a limpeza periódica e o mínimo de manutenção. 

A casa mais antiga é um exemplar de uma outra era. Tem um oratório na parede frontal da residência, grade baixa, forro de estuque reparado em alguns trechos com forro de pinus. Piso de caquinho vermelho na garagem e áreas externas e vermelhão na sala. Um jardinzinho limpo, igual me lembrava de 1997. Até uma assustadora aranha grande pendurada em sua teia no beiral. O lugar está parado igual quando eu sai de lá em 1999. Nessa parte nada mudou. Está há 26 anos estacionada no tempo.

Já ao lado, o terreno gigantesco já não está mais livre. O mausoléu está sobre ele. Subsiste uma mangueira de bom porte rente ao muro da frente. O portão de madeira que viu meu tio Leonel pular com medo do falecido cão "Roliço" também não existe mais. No local um muro e outro portão de metal. 

Tudo o que existe se muda constantemente. É física. Por mais que tenhamos a impressão de que muitas coisas possam estar iguais, na verdade, é óbvio, elas só se parecem iguais. 

Na minha mente essa casa era ainda maior do que a que eu pude visitar nesse carnaval.

Eu era pequeno e aquele terreno enorme era uma fazenda para mim. Ter tido a chance de ter a infância que tive é razão para agradecer à Deus por esse privilégio. Não sei se uma infância em um apartamento de 40 metros quadrados tem o mesmo sabor. É possível que não, apostaria. 

sábado, 1 de março de 2025

Curtas

 Li esses dias que há milhares de vagas de emprego no setor supermercadista de São Paulo, mas existe uma dificuldade gigantesca em suprir essas vagas, pois, considerando a remuneração baixa que é ofertada, o trabalhador em potencial desse ramo de atividade prefere manter-se na informalidade, juntando a grana que faz com bicos com o dinheiro que o governo lhe dá, via Bolsa Família. Eis ai um exemplo vivo de como a interferência do estado na economia é, quase sempre, fonte da criação de distorções piores do que a sua inação geraria. Estamos diante de uma geração de gente que se acostumou a comer das mãos do governo, a esperar que tudo venha do estado, que o poder público onipresente resolva todos os problemas da sua vida, seja a cura de um câncer, uma unha encravada ou a educação de sua prole. Não tardará e surgirá um vale ou bolsa cabeleireiro, bolsa manicure, bolsa cílios e sobrancelhas, etc. E o povo continuará esperando sempre mais e mais benefícios estatais. Horda de inúteis. Precisamos voltar ao darwinismo social. 

***

Tenho a mente inquieta com a criação de projetos. Projetos com os quais eu não tenho nenhuma relação ou ligação direta. Planejo cidades, bairros, linhas de ônibus, projetos de infraestrutura industrial, reformas de igrejas, criação de empresas e comércios. Nada do que planejei nesses campos, desde a infância até a presente meia-idade jamais esteve perto de se realizar e, fatalmente, até o findar do meu labor nesta vida, jamais estarão. Sou tão maluco que planejo uma reorientação geopolítica da América do Sul, pregando a dissolução do Brasil enquanto estado nacional e a criação de novas repúblicas independentes menores, se bem que neste caso particular, há um enorme grupo de pessoas que também planeja isso e se articula para que um dia a realidade geopolítica sul-americana e mundial assista o nascimento das novas repúblicas soberanas da América Portuguesa. Essas ideias jamais me causaram qualquer prejuízo. Entendo que são positivas. São o resultado da fertilidade da minha imaginação. Tolkien criou o mundo do Senhor dos Aneis. Eu tenho um mundo novo criado todos os dias na minha cabeça, que, invariavelmente, se passa na cidade de São Paulo. Ao menos, está na porta de casa.

***

Lutero deu o exemplo. Estando em uma igreja, não sendo possível reformá-la, como era seu intento original, é melhor apartar-se dela. Os protestantes, no geral, entendem bem essa lógica. Não todos. Na Congregação tem existido um fenômeno desde os anos 2000, que é a saída ou afastamento compulsório de pessoas da comunhão da igreja, mas, por rancor, essas pessoas fazem de sua profissão de fé o maldizer da antiga denominação. Tivessem sabedoria sairiam e buscariam alguma outra denominação, onde a sua visão de cristianismo estivesse mais bem acolhida, ou ainda, caso fosse, que criassem uma nova denominação. Mas, nem uma coisa nem outra. A fé dessa gente é malhar a velha casa. Agora, um sujeito recentemente expulso, por negar disciplina e o código de ética do corpo ministerial, está se vendendo como vítima. Tem método, não humano, mas do adversário nisso aí. Colocar é fácil, difícil é tirar do ministério.

O contador

 "Papai em 80 mudou-se da capital para cá, quando passou no concurso de procurador da câmara municipal. Ele e mamãe já estavam juntos h...