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segunda-feira, 31 de março de 2025

Uma historiografia das épocas

Cada período escreve a sua história dando ênfase na inquietação daquele momento. A observação é do professor Hilário Franco Júnior, no livro A Idade Média, nascimento do Ocidente. Ele aponta: a pólis grega marcou com o aparecimento da história política; a idade média em seus mosteiros preparou as biografias de santos, as hagiografias; a afirmação dos estados e monarquias nacionais no século XVIII trouxe a história dinástica e nacional (comento: e o século XIX, antevendo a crise dessas monarquias, com o romantismo, buscou reforçar essa identidade nacional); por fim, no século XX de esperanças utópicas (socialistas e liberais-democráticas) o estudo da história das mentalidades. 

E a história do tempo presente, da geração do novo milênio? Me parece ser a geração da história da loucura, da desorientação planejada e mesmo da história da indecência. 

A linha de pesquisa do historiador é uma afirmação do seu entendimento final de sua época sobre si mesma ou sobre outro período. Como vivemos tempos anarquicos e dementes, somente uma historiografia da indecência e da loucura poderia ter voz forte. 

segunda-feira, 10 de julho de 2017

O real progresso

Hoje poucos pensadores seriam tão audazes a ponto de identificar o avanço material da civilização europeia moderna com o Progresso em seu sentido absoluto, pois agora nos damos conta de que a civilização pode prosperar externamente e dia após dia crescer mais e mais barulhenta e mais rica e autoconfiante, enquanto ao mesmo tempo apequena-se em vitalidade social e perde contato com suas tradições culturais mais altas.

          Do livro Progresso e Religião, de Christopher Dawson.

sexta-feira, 5 de maio de 2017

Leitura: História da URSS


Tem já um certo tempo que eu busco ler mais a respeito da Revolução Russa e da História Russa, em geral, mas, em particular, da História do período soviético. Reputo e considero que a Revolução de 1917 foi o fato de maior importância de todo o século XX e o fim da URSS em 1990 como o fim da História Contemporânea.

Esta edição dos anos 60 do francês Jean Bruhat é uma introdução ao estudo da Rússia Soviética, até o período de sua publicação (o último fato de vulto narrado no opúsculo foi a Corrida Espacial). Não penso que hoje ela pudesse ser indicada para qualquer leigo que quisesse conhecer mais a respeito dos soviéticos. É uma obra marcada por sua época, de caráter descritivo, sem, contudo, deixar de se manchar pelo marxismo francês do autor.

Sobre Jean Bruhat, aliás, temos as seguintes informações.


Nasceu no ano de 1905 e morreu em 1983. Foi um historiador marxista especializado no estudo do movimento operário. Em Paris se filia ao Partido Comunista e adere à militância, sem se desmobilizar do ensino e da produção de obras acadêmicas. (Fonte)

Fato que não posso deixar de dar destaque em História da URSS é que, mesmo falando abertamente sobre o governo Khrushchov, não há, praticamente, nenhuma linha sobre as revisões programáticas feitas pelo PCUS nesse período e também nada é dito sobre os milhões de mortos da época Stalinista, mantendo como única crítica sobre esse período o excessivo personalismo feito sobre a figura de Stalin.

A não ser que você seja um historiador ou interessado em conhecer e compreender as narrativas feitas sobre a União Soviética ao longo da História, este livro terá pouca utilidade para entender realmente a história desse que foi o maior marco geopolítico de todo o século XX.

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

A RENÚNCIA DE JÂNIO QUADROS E A CRISE PRÉ 64 – MONIZ BANDEIRA

Luiz Alberto Dias Lima de Vianna Moniz Bandeira, 2º Barão de São Marcos, o "nobre comunista".


A política brasileira até hoje ainda não ultrapassou a fase, onde nossos principais dirigentes públicos eleitos, são descendentes diretos da política que se formou durante o regime militar, cujo início data de 1964. Para compreender determinadas tomadas de posição de nossos políticos é necessário buscar na história desse período as determinações para esses posicionamentos.

A Revolução de 1930 e a ascensão de Getúlio foi um paradigma de grande vulto na história deste país. Após Getúlio, as políticas de assistencialismo e de paternalismo fizeram com que parte dos cidadãos, do eleitorado, tendessem a se voltar a um político de feitio populista, que com algum carisma, concedia alguns benefícios aos trabalhadores urbanos. Não necessariamente, essas políticas estavam associadas aos grupos que costumam a querer ser os monopolizadores da capacidade de se fazer ações que favoreçam a população, a esquerda política. Getúlio Vargas, por exemplo, não era um líder esquerdista, e nem mesmo costumou abrir muitas brechas para a ação desses grupos políticos, todavia, outros que se disseram continuadores das políticas varguistas, tais como Brizola ou João Goulart, não tivessem o mesmo comportamento.

Jânio da Silva Quadros, nascido no Mato Grosso do Sul, mas radicado em São Paulo, era um líder que tendia, em vários aspectos a se diferenciar do estilo getulista clássico, em suas políticas econômicas, sobretudo. Jânio tendia a ser, sob o ponto de vista da moralidade pública, mais conservador do que os grupos ligados ao PTB de Vargas e também do PSD. Embora sendo filiado ao PDC – Partido Democrata Cristão, uma pequena agremiação, Jânio possui forte ligação com a UDN – União Democrática Nacional, principal agrupamento político liberal-conservador anti-Getúlio, cuja figura de supremo destaque era o governador do Estado da Guanabara, Carlos Lacerda. Com a vitória de Jânio em 1960, a UDN consegue uma vitória histórica.

Segundo a legislação vigente naquela época, a eleição do presidente e a do vice eram separadas, de modo que era possível eleger o presidente de uma legenda e o vice de outra. Jânio foi eleito presidente e João Goulart, ex-ministro do Trabalho de Getúlio Vargas, candidato do PTB, foi eleito vice. Era a dupla Jan-Jan. 

O livro de Moniz Bandeira parte do pressuposto, segundo aquilo que afirma o autor, de que o governo já nasceu sob as brumas da conspiração golpista, a ser dada por Jânio junto com as Forças Armadas e setores nacionais ligados ao capital estrangeiro e aos produtores rurais exportadores. 

João Goulart e o seu partido, o PTB, propugnavam a implantação das chamadas Reformas de Base, sendo as principais, a agrária, a da educação, a fiscal e a política. Segundo o que Bandeira afirma, as elites se preocupavam muito com esse discurso de Goulart e do PTB e por isso mesmo tenderam a apoiar Jânio. Se essas reformas de base fossem colocadas em prática, a questão da remessa de lucros das empresas multinacionais instaladas no Brasil seriam revistas, de modo que houvesse uma contenção no envio dessas divisas às sedes dessas multinacionais no exterior. A reforma agrária também, outro ponto nevrálgico das reformas janguistas-petebistas, atentaria diretamente contra a quase sacralidade existente em torno do direito à propriedade privada. Esses discursos apavoravam a grande parte das elites (como se dizia na época "as elites conservadoras").

Jânio, por sua vez, sob o ponto de vista econômico colocou em prática uma política de austeridade, sugerida pelo Fundo Monetário Internacional. Na política externa, tentou uma aproximação do Brasil com os países comunistas, como a China, Cuba e a União Soviética.  Uma de suas ações mais polêmicas foi a condecoração do líder revolucionário Ernesto Che Guevara. De acordo com Moniz Bandeira, essas atitudes de Jânio na política externa, visavam a tentar atrair para si, dentro do país, o apoio das forças políticas de esquerda, ao mesmo tempo em que economicamente cumpria a cartilha do FMI, o que agradava aos Estados Unidos e aos países a ele coligados, no âmbito da Guerra Fria.

Jânio também tinha a intenção de promover reformas no Brasil, sobretudo visando dar ao país mais competitividade, reduzindo a burocracia e a ineficiência estatal, mas essas políticas, por sua vez, não eram do agrado de políticos de esquerda, ligados ao PTB. Dessa forma, Jânio Quadros também se sentia amarrado para implantar essas reformas. Segundo o autor, Jânio almejava promover um golpe de estado, de modo a assumir com poderes extraordinários e então fazer as reformas desejadas. O tiro saiu pela culatra.
Jânio esperava sair como uma herói dessa jogada política, esperando ser conclamado pelos braços do povo a assumir de volta a presidência, tendo já os militares quebrando a ordem constitucional, entretanto a articulação que ele fez com os militares não foi feita de um modo favorável a Jânio. Os militares aquietaram-se e o presidente da Câmara Federal, Ranieri Mazzili tomou posse, até João Goulart que estava em viagem diplomática na China retornasse ao país e tomasse posse.

A Jânio restou voltar a São Paulo, sua terra, onde buscou forças para poder literalmente dar a volta por cima, mas com a instauração do Regime Militar em 31 de Março de 1964, políticos tradicionais foram enxotados pelos militares. Jânio, Juscelino, Adhemar de Barros, Carlos Lacerda e muitos outros tiveram que se aquietar de modo a evitar maiores problemas. Setores militares os enxergavam como parte do problema ao qual o Brasil havia chegado: a radicalização de discursos e práticas entre a esquerda e a direita, além do caos na vida pública nacional. Os militares se investiram a função de libertadores nacionais. Acho que não foram muito bem sucedidos nisso.

BANDEIRA, Moniz. A Renúncia de Jânio Quadros e a Crise pré-1964. São Paulo: Editora Brasiliense, 2ª edição, 1979.

sábado, 13 de agosto de 2011

Livro "Genocídio Americano: A Guerra do Paraguai" de Júlio José Chiavenatto

CHIAVENATTO, Júlio José. Genocídio Americano: A Guerra do Paraguai. São Paulo/SP; Círculo do Livro, s/d.

O livro "Genocídio Americano: A Guerra do Paraguai" do jornalista paulista Júlio José Chiavenatto trata, sobretudo, dos bastidores políticos e econômicos que envolveram este conflito (a Guerra do Paraguai) o maior já travado em todo o continente americano.

Publicado na década de 1970, onde no Brasil vigorava, em plena força, o regime militar, o livro traz também uma visão que não foi bem vista oficialmente por setores ditos "nacionalistas" do governo da época.

O Brasil viveu, desde a proclamação da República, alguns períodos de governos autoritários. Foi assim com os primeiros presidentes, do período chamado "República das Espadas"; posteriormente a uma fase de maior abertura e "democracia" até 1930, quando outro estilo de governo autoritário (mais duro e repressivo do que o primeiro modelo) tomou o poder, agora mais centrado na figura do presidente, papel ocupado então por Getúlio Vargas. Após idas e vindas e o definitivo fim da Era Vargas, um breve período de eleições minimamente livres se seguiu até o ano de 1964, quando os militares, frente a um quadro de completa, total instabilidade política, institucional, risco de ascensão de um governo socialista-populista, assumiram o poder. Eles, os militares, somente largariam o poder em 1984, vinte anos depois.

Em comum a todos o governos democráticos ou autoritários existe a forma de se lidar com a história oficial, ou seja, a versão oficial dos fatos. Vemos que até nossos últimos presidentes ainda se recusam a liberar para consulta pública vários documentos oficiais, que estão em sigilo, tolhendo parte do direito de informação garantido à população do Brasil.

O medo, parece-me, é de que o governo brasileiro tem receio de trazer a público documentos que mostrem papéis que o país já desempenhou e que hoje tenta esquecer e esconder, por não os considerar muito "limpos". Dentre esta gama de episódios históricos se encontra a Guerra do Paraguai.

O mérito de Chiavenatto se dá pelo fato de ter trazido uma versão menos heroica e oficial da Guerra do Paraguai. Ele não foi o primeiro a fazer tal serviço, várias são as publicações que tratam do assunto, inclusive publicações de ex-combatentes, mas estas acabaram sendo postas de lado durante muito tempo, não pela falta de qualidade, mas pelo conteúdo não ser o mais "agradável" e plenamente sustentado pela versão brasileira. Mostrar algumas atrocidades cometidas pelas Forças Militares do Brasil, um país que sempre se gabou de ser extremamente pacífico, não era coisa do agrado, bem como, mostrar outras facetas de pessoas públicas que se tornaram heróis oficiais, "os grandes da nação" (Dom Pedro II, Duque de Caxias, General Osório). Outro, e talvez o principal serviço que este livro traz seja o de tentar mostrar uma visão que seria um pouco mais realista, onde, maniqueisticamente, o Paraguai não é visto como o grande vilão da história, mas exatamente o contrário.

Dividido em capítulos breves e em subcapítulos mais breves ainda – o que facilita a leitura – traz no começo uma apresentação do Paraguai, o que aliás é bastante reforçado pelo autor. O país até o momento em que se travou o sangrento conflito contra a Tríplice Aliança havia tido apenas três presidentes (Francia, Carlos Lopéz e Francisco Solano Lopéz) e todos dirigiram o país com punhos de aço, que caracterizaram no Paraguai um modelo ímpar de regime político nas Américas daquele tempo.

Todos os três presidentes tiveram, de forma geral, uma linha mestra de conduzir o país: perseguindo a mídia e a grande burguesia nacional, os grandes proprietários de terras até que estes praticamente se extinguissem. No Paraguai foi feita uma espécie de reforma agrária, onde os camponeses sem terra começaram a trabalhar nas chamadas "Estâncias da Pátria", fazendas estatais, que produziam grande parte dos produtos agrícolas do país. Também no Paraguai, a base de muito custo e sacrifício desenvolvia-se uma indústria que mostrava sinais de pujança, totalmente nacional, sem a presença maciça de capital estrangeiro, sobretudo o inglês.

No Paraguai havia então níveis de desenvolvimento humano muito superiores aos de todos os países sul-americanos, que, à época, se mantinham economicamente a base de exportações de matérias primas para a Europa e de comprar quase todos os produtos industrializados no exterior. Com mão de obra em grande parte sustentada pelos braços escravos dos negros, ainda se trazia para a América diversos serviços prestados pelas companhias europeias, como iluminação e calefação, gás e transportes. No Paraguai o cenário era muito diferente deste.

Francía, primeiro presidente paraguaio vislumbrava que seu país somente iria para frente caso tivesse uma política econômica voltada para o povo, contra os grandes fazendeiros e comerciantes, que constituíam uma elite predatória, não comprometida com o futuro e o desenvolvimento da nação guarani. Este ideal foi seguido pelos outros dois presidentes que se sucederam a Francía, o pai, Carlos Lopéz e o filho, Francisco Solano Lopéz.

O Paraguai, através de seus governantes, quando se sentia prejudicado em alguma negociação ou serviço adquirido de outra nação não pestanejava e lutava por seus direitos e pela legalidade nas negociações e contratos. Nessa lógica, a industrialização paraguaia começou a deixar temerosa a maior potência econômica e militar da época, a Inglaterra.

Chiavenatto mostra-nos que a Inglaterra tinha receio de que o exemplo de independência plena do Paraguai acabasse sendo seguido por outros países da região e com isso a "Terra da Rainha" perdesse mercados consumidores de seus serviços e produtos, além de, automaticamente, ganhar novos concorrentes. De fato o Paraguai não era o melhor exemplo de subserviência a interesses que não fossem aqueles imediatamente mais altos à nação.

Segundo o autor, a Inglaterra seria a grande incentivadora da guerra, sendo seus representantes países que lhe eram aliados e a ela ligados pelos vultuosos empréstimos que contraiam há tempos. Nesta lógica, Argentina, Brasil e de contrapeso o Uruguai seriam meras buchas de canhão do "imperialismo" inglês.

Alguns historiadores criticam este livro por ele, de certa forma, excluir dos motivos básicos para a Guerra os problemas que diziam respeito unicamente aos países diretamente beligerantes. De fato, isso é muito notório no livro, Júlio José Chiavenatto passa boa parte do livro tentando provar por A+B que a Inglaterra foi a grande responsável por tudo.

Ponto positivo a destacar é a relativização que o autor faz. O Paraguai, país governado por presidentes que, embora ditadores, fizeram o país alcançar altíssimos níveis sociais, ao contrário de todos os seus vizinhos. Parece-me, Chiavenatto não diz isso textualmente, que ele mesmo tem essa sensação, aliás da qual também partilho, de que não restam dúvidas de que o governo forte do Paraguai foi muito melhor para aquele país do qualquer outro que tenha vindo depois .

A desmistificação de Solano Lopéz, presidente paraguaio durante o período da guerra, que era apresentado à época no Brasil como um tirano assassino, conquistar implacável, o "Átila das Américas", mostrando que ele era um homem com virtudes e com defeitos, assim como todos nós, e não somente um monstro feito apenas de maldades, que não tinha em seus planos para o Paraguai nenhuma política expansionista, e que tão somente buscava o bem do Paraguai e o equilíbrio na Bacia do Prata, necessária ao desenvolvimento guarani.

Como disse também anteriormente, importante também é a desmistificação do papel de eterno "mocinho" da história que o Brasil acaba reivindicando e mesmo levando. Este país matou muita gente covardemente, e nisto se inclua velhos, mulheres e sobretudo crianças. Quase a totalidade (mais de 90% dos) dos homens paraguaios foram mortos neste conflito. Que nos diga Acosta Ñu!

O livro tem um estilo bastante corrido, ilustrativo, jornalístico simplesmente, mas é muitíssimo bem amparado em documentos e fontes de época. Muitos dos fatos em "Genocídio Americano: a Guerra do Paraguai" tem provas documentais. O tamanho do livro (224 páginas) também ajuda a leitura, que poderia, sem nenhum problema, ser realizada por alunos do ensino médio.

Sem dúvida trata-se de um livro polêmico, que contraria muitos interesses, mas cuja leitura é importante para que o reflexivo contraponto, extremamente necessários a todos os cidadãos e mais ainda a historiadores, seja realizado.
***
Júlio César Dos Santos Bueno. Aluno de história do 4º Semestre - Centro Universitário Sant' Anna. Agosto/2011. São Paulo/SP

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