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terça-feira, 18 de julho de 2023

Resenha: A Revolta dos Novos Farrapos, de Delmar Marques.





Um interessante livro. Um romance de história alternativa. Não conheço muitas obras desse feitio, tratando da realidade política, social e histórica do Brasil. Imagine que ali nos anos 80, na época da redemocratização, o clima político gerasse uma nova Farroupilha.

O cenário é bastante parecido com o que vivemos há mais de trinta anos. Aponto alguns elementos da paisagem que encontram total lastro na realidade. 

1. Greve de arrozeiros. 
2. Bloqueio de rodovias. 
3.Agitações militares. 
4. Greve de professores. 
5. Greve dos demais servidores.
6. Greve de celetistas. 
7. Invasão da assembleia legislativa e palácio do governo. 
8. Brigada militar aquartelada. 
9. Pessoas feridas por militares em manifestações. 
10. Mobilizações de sem terra. 
11. Inexistência de reforma agrária. 
12. Estações de rádio encampadas.
13. Discurso anti-mídia estrangeira. 
14. Formação de milícias civis. 
15. Empresário alemães gaúchos neonazistas!!! 
16. Cenas de flerte e lascívia entre um aspone e uma grevista. 
17. Falência das contas públicas. 
18. Explosão de bomba (ref. RioCentro).
19. O candidato da direita citado é um industrial Paulista. 
20. Expectativa por ação dos militares. 
21. Final com acordão político, embora com alterações no modelo legal/constitucional (ou seja, uma revolução que dá certo).

Todos esses 21 itens são factíveis com a realidade. É o que se vê acontecer na política desse país. Claro, há elementos aí que são absolutamente literários e servem para dar ares mais interessantes ao romance, como a presença de um espectro de industriais neonazistas gaúchos, que se reúnem de tempos em tempos para vestir suas velhas fardas pretas da época da II Guerra Mundial. Isso, claramente, é um elemento que não tem importância nenhuma na nossa política, mas, em se tratar da mente progressista, que vê fantasmas de fascistas e nazistas em toda a parte e que chama todos aqueles que são seus adversários políticos ou que apenas pensem diferente de fascistas, a presença desses personagens passageiros não chega a causar espanto. 

Se eu fosse da Rede Globo toparia filmar isso como minissérie. Teria apelo. Se bem que aqui o Brizola é personagem que passa discreto, mas está presente e a Globo odiava o "Brisa". Quer dizer, o Roberto Marinho. Essa Globo de hoje adora esquerdistas.

Há alusões em uma passagem que me lembram um livro que foi usado nas aulas de geografia da 7ª série, chamado A Invasão Cultural Norte Americana, da Júlia Falivene Alves. Aquele papo de Mcdonalds e Coca Cola, imperialismo cultural e etc. É a cara do discurso de quem frequentava o Fórum Social Mundial...

Mas, no fim, a nova Farroupilha consegue melhores condições para o Rio Grande num contexto constitucional de um federalismo político mais amplo ou de um estado autonômico. Não é recriada a República Rio-Grandense, como o leitor espera durante o livro. Seria um cenário divertido.

Eu gostaria de ver um desenlace como esse ocorrer. Uma revolta que proporcionasse um cenário de mais descentralização política e colocasse o governo federal de plantão de joelhos. Seria bom não só para o Rio Grande do Sul, mas para todos os estados da federação.


domingo, 30 de abril de 2023

Comentários sobre a obra VRIL - O poder da raça futura, de Bulwer-Lytton.

 A literatura está repleta de livros que dão asas à imaginação prodigiosa de autores que pensaram sociedades alternativas e utópicas, visões muitas vezes propositivas de seus ideários, mas ocultados e disfarçados sob o véu de obras de ficção. Reputo, por exemplo, A Máquina do Tempo, de H.G. Wells como um livro que se enquadra perfeitamente nesta categoria. São conhecidas as ligações do senhor Wells com sociedades políticas secretas socialistas, no caso a malfalada Sociedade Fabiana, que propunha um socialista reformista, lento e gradual. O símbolo dessa sociedade política era, aliás, uma tartaruga, para ilustrar que os seus membros não tinham pressa em alcançar os seus fins. Todo esse projeto de poder mundialista e globalista, que hoje é tema de discussões e chamado pela imprensa hegemônica de teoria da conspiração da ultra direita, no fundo, é a continuação das discussões iniciadas ainda no século XIX sobre alternativas socialistas para a construção de um mundo perfeito, que suplantasse a luta de classes por meio de reformas sociais-democratas.

Há literatura utópica que propõe um mundo, como um diagrama a ser seguido, como já citei "A Máquina do Tempo", mas poderia citar a Utopia, de Tomás Moro, livro ainda do século XVI, ou A Cidade do Sol, de Tomaso de Campanella. Há também livros que denunciam a degeneração da utopia, quando realizada, como é o famosíssimo caso de 1984, de George Orwell, que, sendo um socialista um pouco arrependido, após ver os caminhos que o socialismo real estava trilhando, denunciou a escravidão absoluta que o homem poderia estar submetido em um estado socialista totalitário. Precisamos reforçar sempre que todo estado totalitário moderno é sempre um estado socialista, por mais que venha a ter matizes diferentes. Há versões nacionais de socialismos. Há socialismos de empresários monopolistas, como é aquele proposto por grupos globalistas, que até apelidaram seu ideário mais recentemente de capitalismo (sic) de stakeholders. Aproveito para lembrar que a Revolução Russa foi totalmente financiada por banqueiros judeus americanos de Wall Street. Lembro também que todo desenvolvimento tecnológico feito pela União Soviética e pela China somente foi possível com a entrega de tecnologia por parte de países capitalistas ou o simples roubo dessas tecnologias. O socialismo não é criador nem multiplicador de riquezas e de tecnologias. Vejam a Cuba do século XXI, em que tal miséria vive, absolutamente isolada em seu socialismo autárquico, que mantém uma população completamente miserável e famélica. Cuba sem recursos doados pela URSS nunca conseguiu deixar de ser uma ilha-favela, pior e mais pobre do que muitas favelas brasileiras.

Contudo, me chamou a atenção uma obra de utopia não tão conhecida nem tão lida no Brasil, do autor esotérico Edward Bulwer-Lytton. Inglês do século XIX, lançou VRIL - O poder da raça futura sete anos após o livro mais famoso de Júlio Verne, Viagem ao Centro da Terra. Vril também se passa no centro do planeta Terra, que seria oco, fazendo referências claras à tradições religiosas e místicas orientais, como no budismo tibetano, que prega a existência de Agartha, uma cidade secreta no centro do planeta, somente acessada por pessoas especiais, a partir de caminhos ocultos e preservados por mestres tibetanos. Sobre Agartha, posso recomendar o livro do jornalista e escritor polaco Ferdynand Antoni Ossendovsky, Bestas, Homens e Deuses (traduzido e publicado em português). Ossendovsky nasceu em uma família polonesa abastada, tendo vivido na comunidade evangélica reformada polonesa (país majoritariamente católico) e viveu viajando pelo Oriente, onde entrou em contato com diversas narrativas e tradições religiosas e místicas. É considerado um dos grandes nomes da literatura de viagem. 

O personagem central da história, um humano que em algum local incerto e não sabido, no século XIX, adentrou uma antiga mina e perscrutando aquele ambiente acaba descobrindo uma fonte de luz muito incomum, nunca vista por ele, que lhe desperta a atenção, junto com um seu companheiro. Sendo atraídos pela curiosidade, atravessam em direção a essa luz dentro da caverna da mina e entram em um mundo novo, subterrâneo, mas iluminado e composto de paisagens naturais que, embora distintas das terráqueas, ainda assim lembram a superfície. Ao entrar em contato com os seres desse mundo, o personagem central descobre uma sociedade avançada, humanóide, que migrou para o centro da Terra após alguma catástrofe natural antediluviana, que fez com que progredissem muito e em ritmo diferente dos povos da superfície. (A imaginação do leitor que tem referências bíblicas não pode deixar de pensar que tais habitantes, bonitos, mais altos e alvos do que os homens da superfície, seriam néfilins, supostos híbridos entre as filhas dos homens e anjos caídos, como é citado no Antigo Testamento.)

Uma obra utópica serve precipuamente, ou deveria servir, para questionar a sociedade vigente. Pode servir como tema para discussão de qual caminho aquela sociedade pretende tomar e seguir ou ainda de quais decisões abortar, como é mais característicos em obras que denunciam o caráter totalitário de sociedades utópicas (as distopias, como 1984). No caso de Vril, a sociedade subterrânea é muito avançada tecnologicamente e também socialmente. É uma monarquia eletiva que elege um magistrado ilustrado que governo temporariamente aquela comunidade. A civilização subterrânea não padece de problemas sociais de nenhuma natureza. Não há problemas de natalidade, de desabastecimento de comida, de violência, de ocupação do território. Todas as comunidades são pequenas e quando o número de população de uma delas cresce em demasia, há um fluxo migratório para outras comunidades, de modo que as cidades são pequenas e perfeitamente se mantém em equilíbrio. Não há trabalho manual, no geral, pois as atividades do dia são realizadas por robôs autômatos. O próprio trabalho intelectual é basicamente desprezível, pois não há muito o que ser questionado ou repensado, já que há o domínio da energia do Vril, mais forte nas crianças e nas mulheres - em especial nas mulheres - afinal, essa sociedade perfeita do submundo é uma ginecocracia. Até a religião está pacificada. Todos creem em um ser supremo, uma divindade que dá a vida e a retira quando quer. Toda a crença religiosa é uniforme e pacificada. Não há discussão dogmática ou de natureza teológica, por absoluta falta de necessidade. Todo ordenamento socialmente está plenamente pacificado. Não há, essencialmente, discórdia.  Há ali paz e felicidades perpétuas. A compreensão e o entendimento são plenos, inclusive em temas como a morte ou o casamento e a reprodução. Entendo essa sociedade apresentada como uma representação idealizada do paraíso. É uma sociedade sem escassez. A economia é um detalhe administrativo, pois a energia do Vril e a tecnologia dão jeito de cuidar de tudo. Papéis etários e de gênero são diferentes. O casamento é no começo da adolescência e são as moças que escolhem os seus pares. Depois de casados, quando atingem a maturidade, a vida é só paciência e pacificação, na esperança do fim dos dias. O enrosco do personagem central se dá quando a jovem mais poderosa daquele reino decide escolher o forasteiro como o seu parceiro de casamento, algo que geraria um cruzamento genético espúrio e indesejado. 

Há como perceber na obra influências de ideias e correntes de pensamento da época, como do darwinismo (evolucionismo), diria eu também do positivismo comteano, conforme observamos essa sociedade harmoniosa, liderada por um magistrado absolutista e ilustrado, baseada em compreensão e em amor. Confesso que percebi menos referências esotéricas e ocultistas do que estava esperando, pela fama do livro e do autor. Sabemos que a palavra VRIL, entendida como uma energia vital, será tratada no decorrer do século XIX e começos do século XX com um sentido objetivo e real, não como fantasia. Max Heindel, um dos mais destacados líderes do Rosacrucianismo, enxergava o domínio da energia VRIL (ou desse-se a ela o nome que fosse) como a mais nova revolução científica que estaria no limiar. Suplantaria a revolução da energia mecânica, da máquina a vapor, da energia elétrica e do éter. 

Não pode deixar de comentar como a temática do VRIL me lembra de William Reich e do orgônio, suposta energia (de origem sexual) que ele conseguiria controlar por meio de técnicas e aparelhagem específica (caixas de Reich). Devo também lembrar que a canalização de energia sexual é tema recorrente em sociedades esotéricas, em círculos maçônicos e druídicos. Supostamente isso esteve presente nos círculos fechados do III Reich. Supostamente também Hitler teria lido esse livro de Bulwer-Lytton e se inspirado nela para pensar e formular determinados aspectos e políticas do estado alemão para o Reich de mil anos. Me parece bastante nebuloso determinar quais são os reais limites disso no campo real e no campo da fantasia e das ilações livres. Demandará uma pesquisa que talvez eu possa fazer futuramente, indo direto em fontes bibliográficas pouco exploradas no Brasil, traduzindo textos do alemão, sobretudo. 

A conclusão que chego é que muito ainda pode ser escrito sobre as utopias e as sociedades secretas e esotéricas. Considere-se sempre que toda a rápida mudança que nossa civilização tem atravessado desde o fim da II Guerra Mundial é o resultado de uma guerra oculta travada entre sociedades secretas e grupos de poder, no centro do capitalismo financeiro e do socialismo. A hibridização entre financeirismo, monopolismo e socialismo é o Godzilla que está para destruir o mundo. Há ainda o aspecto do milenarismo que deve sempre estar presente em todas as discussões e debates acerca desses temas. Acredito que as crenças heréticas milenaristas podem estar no centro do movimento histórico reformista e revolucionário, com uma matização nem sempre tão clara e nem sempre tão definitiva, mas, ainda que de maneira assessória, é um elemento que precisa sempre ser considerado na história dos movimentos políticos do Ocidente, desde a Baixa Idade Média, pelo menos.

Edward Bulwer-Lytton


domingo, 19 de novembro de 2017

RESENHA: J.J. Veiga "Sombras de Reis Barbudos"

Capa de uma edição antiga, do Círculo do Livro, de Sombras de Reis Barbudos. Na infância tivemos em casa um exemplar como esse por mutos anos, até que ele acabou sendo alvo de cupins e da chuva, se não me falha a memória. Foi para a doação ou para o lixo, não me recordo bem. Recentemente li esse livro, após encontra-lo em um espaço de compartilhamento de leitura de um parque público paulistano. Outra versão, também velhinha, sem capa, do Círculo do Livro. Vemos ai os muros e os urubus.

Diversos autores, ao longo da história, escreveram obras que tiveram como enfoque imediato a defesa da liberdade humana como valor fundamental e como princípio, que quando se faz ausente, mostra toda a sua necessidade para aqueles que passam a sofrer as privações advindas da tirania. José J. Veiga em "Sombras de Reis Barbudos" nos vem dar uma excelente demonstração de como a vida humana pode se tornar trágica em um ambiente onde a liberdade passa a ser constrangida.

Ambientada em alguma cidade do interior durante o período do Regime Militar, embora no livro não sejam citados nem o nome real da cidade (na ficção é Taitara) nem mesmo uma referência expressa sobre o período 1964-1985, podemos, no entanto, entender que a história se encaixa perfeitamente nesse contexto.

Lucas, um menino é o principal personagem e o narrador da história. Tudo ocorre quando uma grande firma chega na cidadezinha, trazida pela tio do garoto. Pela narração vemos o tipo do sujeito que saiu do rincão e foi pra cidade, onde prosperou no setor privado, voltando triunfante para sua terra, agora com os ares de novo e aclamado rei, atraindo a boa vontade e o entusiasmo de todos. A chegada da Companhia é acompanhada de entusiasmo geral, de uma perspectiva de crescimento e de prosperidade para todos, como podemos dizer que foi o período exatamente imediato ao golpe de 31 de Março de 1964, quando grande parte da população aplaudiu a ação tomada, a partir da cidade mineira de Juiz de Fora, pelo general Olympio Mourão Filho.

Passa-se um pouco de tempo e esse tio de sucesso, repentinamente, deixa a empresa e o interior, retornando para a capital, com a sua esposa. Nesse meio tempo, o pai do nosso protagonista e cunhado do executivo da empresa acaba sendo empregado pela firma e a expectativa na família é que assim como o tio que foi demitido que o patriarca também seria, mas, surpreendentemente, isso não ocorre e ele não só permanece empregado como também acaba ascendendo profissionalmente e se torna fiscal da companhia.

Durante a narrativa do livro fica demonstrado o papel especial que os fiscais da empresa tem na cidade. A alusão aos agentes fiscalizantes da lei, do mundo real, é visível. São aqueles que se põem em um pedestal para poderem, por meio da intimidação e da atemorização, obterem vantagens e favores sobre todos os demais. É o guarda, o bedel, o agente que recebe suborno, o policial que obtém facilidades de comerciantes ilicitamente. O pai do menino é o arquétipo disso tudo.

O tio exitoso sai de cena, doente, e a história passa a ficar centrada na família, com o pai fiscal, com o menino e com a mãe, preocupada com tudo o que se passa e hesitante com o futuro, mas que parece, durante toda a trama, sem autonomia, sem capacidade de ter ação própria.

Passa-se o tempo, o menino se torna mocinho e seu pai, após alcançar bons postos profissionais na firma acaba deixando o emprego por vontade própria, com o desejo manifesto de se tornar comerciante. Contudo, aquele que havia deixado o estamento burocrático passou a encontrar uma série de dificuldades para restabelecer a sua vida em uma nova dinâmica, afinal, a desconfiança da comunidade é visível com aquele que durante tantos anos foi o seu achacador-mór.

Temos aqui uma alusão clara daqueles que em tantas ocasiões, nos regimes autoritários do século XX, colaboraram com regimes de força, mas que em algum momento desertaram e tentaram encontrar um ponto de inflexão em suas vidas, abandonando as práticas violentas para buscar a realizar em uma vida simples e modesta. O escritor Flávio Gordon, em seu recente best-seller "A Corrupção da Inteligência" chamou isso de "Momento Kronstadt", apontando para uma importante revolta anti-bolchevique (a ideia de se remar contra a corrente da mentalidade revolucionária). Não mais tendo a força dos tempos em que era fiscal plenipotenciário da empresa, o Pai agora não tem a quem recorrer, até que é tragado pela mesma estrutura autoritária da qual fez parte e que ajudou a construir.

O cenário da cidade, com a chegada da Companhia, se transforma drasticamente, sendo cercada e dividida por altos muros, sobre os quais passam a se assentar urubus, que então se tornam elemento do convívio das famílias. Aquele que foi o sinal de mau agouro durante tantos anos passou a ser enquadrado nos moldes dos animais domésticos, como cães, gatos ou aves de gaiola. A presença dos muros, que passam a estabelecer limites claros na cidade, podem ser entendidos não apenas como uma referência à separação das pessoas, promovida pelo aparato tirânico, mas também como um instrumento da realidade de um mundo em processo de modernização, de individualismo, onde tudo passa a ser compartimentado e separado e o velho senso de comunidade acaba sendo perdido, incluindo o enfraquecimento das relações de vizinhança, tradicionalmente sempre muito presentes em todo o Brasil. Lembremos que o período em que, aparentemente, a obra se passa, é a época de modernização e grande surto de urbanização do país. Urbanização é modernidade e modernidade é separação, organização e individualização. Até os urubus, que haviam se convertido em bichos de estimação do povo, foram alvo da sanha burocratizadora dos fiscais da Companhia, que passaram a fiscalizar todos os animais que não fossem registrados e que não dispusessem de uma chapinha de identificação no pescoço.

O autor ainda, subliminarmente, denuncia a atividade restritiva do comércio, por parte das tiranias, que impedem que o Pai compre madeira em outra cidade, pois após retornar para o seu armazém em construção com as madeiras recém adquiridas fora do município, teve o seu carregamento apreendido pela Companhia, acabando por ser denunciado por contrabando sendo levado encarcerado pelos fiscais. Um fim sarcástico para alguém que por longos anos fez exatamente a mesma coisa com outras pessoas que ousavam viver livremente, mas sem se darem conta de que a sua liberdade ameaçava à tirania da Companhia.

Ao fim do livro um surpreendente desfecho: as pessoas começam a voar, para o total desespero da Companhia. A alegoria do voo faz alusão ao voo da imaginação e da individualidade, que não podem ser presas nem contidas por nenhuma autoridade desse mundo, a não ser que os indivíduos se deixem aprisionar pelos tiranos.

Acervo Estadão


REFERÊNCIAS: 

GOMES, Gínia Maria. Sombras dos reis barbudos: a representação alegórica da realidade. Porto Alegre: Revista eletrônica de crítica e teoria de literaturas - Nau literária. Vol. 01 N. 01 – jul/dez 2005 <acessado em 19/11/2017 http://seer.ufrgs.br/index.php/NauLiteraria/article/view/4830/2746>

GORDON, Flávio. A Corrupção da Inteligência. Rio de Janeiro: Editora Record, 2017.

VEIGA, José J. Sombras de Reis Barbudos. São Paulo: Círculo do Livro, 1973. 144 págs.

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