segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

A RENÚNCIA DE JÂNIO QUADROS E A CRISE PRÉ 64 – MONIZ BANDEIRA

Luiz Alberto Dias Lima de Vianna Moniz Bandeira, 2º Barão de São Marcos, o "nobre comunista".


A política brasileira até hoje ainda não ultrapassou a fase, onde nossos principais dirigentes públicos eleitos, são descendentes diretos da política que se formou durante o regime militar, cujo início data de 1964. Para compreender determinadas tomadas de posição de nossos políticos é necessário buscar na história desse período as determinações para esses posicionamentos.

A Revolução de 1930 e a ascensão de Getúlio foi um paradigma de grande vulto na história deste país. Após Getúlio, as políticas de assistencialismo e de paternalismo fizeram com que parte dos cidadãos, do eleitorado, tendessem a se voltar a um político de feitio populista, que com algum carisma, concedia alguns benefícios aos trabalhadores urbanos. Não necessariamente, essas políticas estavam associadas aos grupos que costumam a querer ser os monopolizadores da capacidade de se fazer ações que favoreçam a população, a esquerda política. Getúlio Vargas, por exemplo, não era um líder esquerdista, e nem mesmo costumou abrir muitas brechas para a ação desses grupos políticos, todavia, outros que se disseram continuadores das políticas varguistas, tais como Brizola ou João Goulart, não tivessem o mesmo comportamento.

Jânio da Silva Quadros, nascido no Mato Grosso do Sul, mas radicado em São Paulo, era um líder que tendia, em vários aspectos a se diferenciar do estilo getulista clássico, em suas políticas econômicas, sobretudo. Jânio tendia a ser, sob o ponto de vista da moralidade pública, mais conservador do que os grupos ligados ao PTB de Vargas e também do PSD. Embora sendo filiado ao PDC – Partido Democrata Cristão, uma pequena agremiação, Jânio possui forte ligação com a UDN – União Democrática Nacional, principal agrupamento político liberal-conservador anti-Getúlio, cuja figura de supremo destaque era o governador do Estado da Guanabara, Carlos Lacerda. Com a vitória de Jânio em 1960, a UDN consegue uma vitória histórica.

Segundo a legislação vigente naquela época, a eleição do presidente e a do vice eram separadas, de modo que era possível eleger o presidente de uma legenda e o vice de outra. Jânio foi eleito presidente e João Goulart, ex-ministro do Trabalho de Getúlio Vargas, candidato do PTB, foi eleito vice. Era a dupla Jan-Jan. 

O livro de Moniz Bandeira parte do pressuposto, segundo aquilo que afirma o autor, de que o governo já nasceu sob as brumas da conspiração golpista, a ser dada por Jânio junto com as Forças Armadas e setores nacionais ligados ao capital estrangeiro e aos produtores rurais exportadores. 

João Goulart e o seu partido, o PTB, propugnavam a implantação das chamadas Reformas de Base, sendo as principais, a agrária, a da educação, a fiscal e a política. Segundo o que Bandeira afirma, as elites se preocupavam muito com esse discurso de Goulart e do PTB e por isso mesmo tenderam a apoiar Jânio. Se essas reformas de base fossem colocadas em prática, a questão da remessa de lucros das empresas multinacionais instaladas no Brasil seriam revistas, de modo que houvesse uma contenção no envio dessas divisas às sedes dessas multinacionais no exterior. A reforma agrária também, outro ponto nevrálgico das reformas janguistas-petebistas, atentaria diretamente contra a quase sacralidade existente em torno do direito à propriedade privada. Esses discursos apavoravam a grande parte das elites (como se dizia na época "as elites conservadoras").

Jânio, por sua vez, sob o ponto de vista econômico colocou em prática uma política de austeridade, sugerida pelo Fundo Monetário Internacional. Na política externa, tentou uma aproximação do Brasil com os países comunistas, como a China, Cuba e a União Soviética.  Uma de suas ações mais polêmicas foi a condecoração do líder revolucionário Ernesto Che Guevara. De acordo com Moniz Bandeira, essas atitudes de Jânio na política externa, visavam a tentar atrair para si, dentro do país, o apoio das forças políticas de esquerda, ao mesmo tempo em que economicamente cumpria a cartilha do FMI, o que agradava aos Estados Unidos e aos países a ele coligados, no âmbito da Guerra Fria.

Jânio também tinha a intenção de promover reformas no Brasil, sobretudo visando dar ao país mais competitividade, reduzindo a burocracia e a ineficiência estatal, mas essas políticas, por sua vez, não eram do agrado de políticos de esquerda, ligados ao PTB. Dessa forma, Jânio Quadros também se sentia amarrado para implantar essas reformas. Segundo o autor, Jânio almejava promover um golpe de estado, de modo a assumir com poderes extraordinários e então fazer as reformas desejadas. O tiro saiu pela culatra.
Jânio esperava sair como uma herói dessa jogada política, esperando ser conclamado pelos braços do povo a assumir de volta a presidência, tendo já os militares quebrando a ordem constitucional, entretanto a articulação que ele fez com os militares não foi feita de um modo favorável a Jânio. Os militares aquietaram-se e o presidente da Câmara Federal, Ranieri Mazzili tomou posse, até João Goulart que estava em viagem diplomática na China retornasse ao país e tomasse posse.

A Jânio restou voltar a São Paulo, sua terra, onde buscou forças para poder literalmente dar a volta por cima, mas com a instauração do Regime Militar em 31 de Março de 1964, políticos tradicionais foram enxotados pelos militares. Jânio, Juscelino, Adhemar de Barros, Carlos Lacerda e muitos outros tiveram que se aquietar de modo a evitar maiores problemas. Setores militares os enxergavam como parte do problema ao qual o Brasil havia chegado: a radicalização de discursos e práticas entre a esquerda e a direita, além do caos na vida pública nacional. Os militares se investiram a função de libertadores nacionais. Acho que não foram muito bem sucedidos nisso.

BANDEIRA, Moniz. A Renúncia de Jânio Quadros e a Crise pré-1964. São Paulo: Editora Brasiliense, 2ª edição, 1979.

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